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quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Muito amigo de Pelé, o cuiabano Almiro foi a 1ª vítima de racismo do Dom Bosco

Almiro (Arq. pessoal de Lito)
A grande confusão que o falecido jogador de futebol, farmacêutico, professor de Educação Física e carnavalesco João Batista Jaudy aprontou no Dom Bosco, inclusive obrigando o azulão a suspender uma monumental noitada no carnaval de 1973, disparando balas de dois revólveres para todos os lados no seu interior, não foi a única vez que o mais antigo clube de Mato Grosso se envolveu num sururu dos diabos, acusado de prática de racismo.

Bem antes do episódio protagonizado por Batista Jaudy, lá por meados da década de 1970, o meia armador Almiro, cuiabano de tchapa e cruz, venerado por todos os mato-grossenses pelo fato de jogar no todo poderoso Santos FC, ao lado de Pelé, Dorval, Mengálvio, Lima, Clodoaldo, Pagão, Pepe e outros astros consagrados, estava se recuperando de uma contusão na casa de seus familiares em Cuiabá e resolveu participar de um jantar dançante do Dom Bosco.

Mas o pessoal da portaria não deixou Almiro entrar sob o pretexto de que ele não era associado, condição da qual o Dom Bosco não abria mão para quem quisesse frequentar o clube. Muito culto, Almiro entendeu que estava sendo vítima de discriminação racial, um sentimento que começava a aflorar com força no Brasil, porém ao contrário do que fez Batista Jaudy, não reagiu à ofensa pessoal.

Antes de deixar as dependências do Dom Bosco, Almiro foi reconhecido e alguns diretores reconsideraram a decisão, franqueando as portas do clube ao famoso futebolista cuiabano. Mas Almiro, com a cultura digna de um intelectual que falava fluentemente inglês, francês, alemão e outros idiomas e era quem servia de intérprete de Pelé nas andanças do Santos pelo mundo entre 1965/69, agradeceu a gentileza dos diretores do azulão, virou as costas e foi embora...

Claro que a atitude discriminatória do Dom Bosco chegou com a velocidade de um raio aos ouvidos do maior língua ferina do rádio de Mato Grosso: Ivo de Almeida. Na época, Ivo de Almeida tinha um programa de rádio chamado “O futebol passado a limpo”, na Difusora Bom Jesus de Cuiabá. E caiu de pau em cima do Dom Bosco, fazendo a agressiva ofensa do Clube da Colina Iluminada a Almiro chegar, com a força de seu poder e influência de comunicador,  às tinas populares...

Foi nessa ocasião que o polêmico Ivo de Almeida cunhou a expressão “Clube da elite”, para se referir ao Dom Bosco. Só que o radialista usava a expressão não no sentido da verdadeira acepção do termo, mas, sim, com o objetivo de denegrir a imagem do azulão, buscando sempre, de forma irônica e sarcástica, jogar o clube contra a torcida mato-grossense.

Completamente cego, Almiro vive a muitos anos em Salvador-BA. Velho amigo de Almiro, Lito, considerado por torcedores saudosistas como o melhor centroavante que já passou pelo Mixto, em todos os tempos, garante que algumas pessoas de cor frequentavam o Dom Bosco embora não fossem associados. Entre elas, o universitário Fábio Firmino Leite.

– A diferença entre os dois é que Almiro era jogador de futebol e Fábio, que inclusive virou nome de bairro na capital (o “Doutor Fábio”) foi o primeiro cardiologista negro cuiabano... – afirma Lito. Ou, se preferirem, médico veterinário Manoel de Aquino Filho. (Republicado por falhas no sistema de acesso).                           

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

A folclórica e gloriosa passagem do lendário Mão-de-Onça pelo Dom Bosco...

Mão-de-Onça, uma lenda do futebol de MT

Numa certa manhã de 1976, o diretor Álvaro Scolfaro chegou à sede do Dom Bosco, no Morro da Colina Iluminada, e viu o gerente de Futebol, Carlos Gaúcho, dando coices até na própria sombra de tanta raiva. E ele tinha suas razões para estar tão furioso: considerado um sujeito muito astucioso, Carlos Gaúcho não se conformava pelo fato de ter sido vítima de sua própria suposta esperteza.

É que dias antes, Carlos Gaúcho chegou ao clube e encontrou na escadaria que dava acesso às suas dependências um mendigo que se dizia jogador de futebol e que havia chegado do sul do Mato Grosso indiviso – o estado foi fracionado em 1977, pelo presidente Ernesto Geisel, sem sequer comunicar ao então governador Garcia Neto – para defender o gol do Dom Bosco. O jogador que Gaúcho tratou como um mendigo e o expulsou do clube era simplesmente  Mão-de-Onça, que acabou se tornando uma lenda do futebol mato-grossense ...

Foi um bafafá daqueles no Dom Bosco quando os dirigentes ficaram sabendo da mancada – para não dizer outra coisa... – de Carlos Gaúcho, pois fazia mais de duas semanas que o clube esperava Mão-de-Onça chegar de Dourados onde defendia o Ubiratan, para assinar contato com o azulão. Depois de uma verdadeira caçada pelas ruas de Cuiabá, o goleiro foi encontrado e levado para a “república” do clube.

Mão-de-Onça, que teve também brilhantes passagens pelo Mixto e o Operário Várzea-grandense, jogou no Dom Bosco durante muitos anos. E ao longo de sua militância nos três clubes, nas décadas de 70 e 80 sempre foi considerado o melhor goleiro do futebol mato-grossense. Mão-de-Onça, cujo nome de batismo era João Ferreira Ramos, morreu o ano passado em Cuiabá, aos 69 anos, vítima de infarto fulminante, provocado pelo alcoolismo.

Uma das muitas renovações de contrato de Mão-de-Onça com o Dom Bosco  passou para a história do clube. Ele tinha um Passat bem usado e para continuar no clube, exigiu, como parte de luvas, um carro do mesmo modelo, mas mais novo. O diretor que negociava com Mão-de-Onça não pechinchou: – “A gente dá o seu como entrada na concessionária e pega um mais novo...”

– O senhor não entendeu. Eu vou ficar com os dois... – foi a resposta de Mão-de-Onça. E ficou mesmo com os dois carros na garagem...

O goleiro era louco por som em carros. Tanto é que os seus dois Passat eram equipados com som da maior potência e qualidade, que inclusive ocupavam todo o espaço dos bancos de passageiros.

Apesar dos dois carros na garagem, Mão-de-Onça, só podia utilizar um deles. Motivo: o Dom Bosco tomou do seu goleiro as chaves de um dos carros quando descobriu que Mão-de-Onça não via a hora dos treinos acabarem, de manhã ou à tarde, para pegar a BR-070 e ir para Barra do Garças passar umas horas com uma professora que havia conhecido durante um evento educacional em Cuiabá.

O Dom Bosco não se preocupava se Mão-de-Onça estava acabando com seu carro na esburacada e poeirenta ou lamacenta rodovia que liga as duas cidades, mas com a possibilidade do seu goleiro sofrer um acidente fatal na sua desvairada aventura para curtir o novo amor...  (Republicado por falha no sistema de acesso).    

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

União arrancou do gramado Santo Antonio enterrado de cabeça pra baixo, mas não evitou goleada...


O União Esporte Clube ia enfrentar o Internacional pelo Campeonato Amador de 1984, de Juara. O mando de jogo era do Internacional e seria realizado no seu campo, de terra, onde o time costumava cantar de galo.  E cantava mesmo, principalmente quando enfrentava adversários habituados a jogar em campos gramados, como era o caso do União.

O Internacional era muito temido pelos adversários por um motivo: seu presidente,  conhecido como Miúdo, gozava da fama de ser um macumbeiro da pesada, o que para quem acredita na interferência do Além no futebol, explicava as surpreendentes vitórias que o time conquistava de vez em quando contra fortes adversários. Seu filho e treinador do Inter, João Chinelo, também era chegadinho numa macumbinha...

No decorrer da semana, os dois eternos dirigentes do União – Luís Casquinha e Priminho Riva – foram surpreendidos por uma proposta de Miúdo: a inversão de mando do jogo. Claro que os dois dirigentes do UECJ toparam a parada, pois entre jogar num campo gramado e um de terra, a preferência seria para o primeiro, evidentemente.

Mas no sábado, Casquinha decidiu dar uma passada pelo estádio municipal, palco do jogo, e observou nas imediações do círculo central do gramado o que parecia ser um buraco. Casquinha se aproximou do local e viu que a terra havia sido removida e cavado um buraco na grama, onde estava enterrada uma imagem de Santo Antonio, de mais ou menos um metro de altura, de cabeça pra baixo...

Imediatamente, Casquinha comunicou o fato a Priminho Riva. E os dois decidiram então arrancar o santo do gramado e levar a imagem, disfarçadamente, para a missa noturna, celebrada aos sábados, na Igreja Católica. O propósito de levar a imagem para a missa era eliminar os efeitos da  macumba de Miúdo e proteger o União no importante jogo do dia seguinte...

Não adiantou nada o esforço de Casquinha e Priminho: o União Juara levou uma goleada de 4x0. “Foi uma “achocolatada” daquelas!” – recorda Priminho até hoje...

O futebol profissional nunca foi o forte de Juara. O União Esporte Clube Juara, fundado em 1980, até que tentou, mas não foi bem sucedido, embora tenha disputado a primeira fase do Campeonato Mato-grossense da 1ª Divisão de 1993. As grandes distâncias das sedes dos municípios do Estado foram o grande empecilho do UECJ. Para jogar em Barra do Garças, por exemplo, o clube tinha que percorrer, ida e volta, cerca de três mil quilômetros...

No entanto, no futebol amador Juara sempre se destacou. E com o correr do tempo, a rivalidade entre clubes tradicionais foi se consolidando e se tornando cada vez mais forte. Os velhos, principalmente entre União, Vila Nova e Internacional, arrastavam multidões de torcedores aos campos onde eram disputados. E é natural que esse fanatismo pelos clubes muitas vezes acabavam desaguando até em pancadarias mais feias do que briga de foice no escuro.

Como aconteceu no longínquo 1984 em uma semifinal entre o União e Vila Nova. Às vésperas do jogo, o vice-presidente do União, Priminho Riva, procurou o presidente Luís Casquinha, para reforçar que o clube tinha que ganhar o jogo, não importava como. Ficou decidido que Casquinha ia procurar o juiz da partida, Valdevir, que já tinha sido goleiro do União, para “facilitar” a vida do clube...

Começou o jogo e Priminho ficou atrás do gol do time adversário, gritando para que seus atacantes caíssem na área para Valdevir marcar um pênalti, conforme tinha sido combinado. Lá pelas tantas, o avante Anderson, suspeitando que um zagueiro do Vila Nova ia lhe dar uma entrada mais violenta, jogou-se no chão, num lance completamente isolado. O juiz não vacilou e marcou o pênalti...

Mas a torcida percebeu que o jogo não passava de um baralho com cartas marcadas para classificar o União para a final, invadiu o campo, que evidentemente não tinha alambrado, e o pau comeu solto. A confusão foi tão grande que até hoje, decorridos 34 anos, o título do Campeonato Amador daquele ano ainda não foi decidido. E nem será, porque os times daqueles velhos tempos nem existem mais...