Bife disputava o Campeonato
Paulista da Divisão Especial de 1978 pelo São Bento, de Sorocaba, cedido, por
empréstimo, pelo Mixto Esporte Clube. As boas atuações do atacante, coroadas
com muitos gols, despertaram a atenção do XV de Novembro, de Piracicaba, que
fica a 80 quilômetros de Sorocaba. Comandado com mão de ferro pelo milionário
comendador Romeu Ítalo Rípoli, o clube piracicabano comprou o passe de Bife,
pagando, sem pechinchar, Cr$ 50 milhões. Na época essa dinheirama era uma
fortuna, que serviu para o alvinegro saldar muitas dívidas, inclusive a folha
de pagamentos atrasada há três meses.
Quando o comendador Rípoli
foi a Sorocaba comunicar a Bife que o XV havia comprado seu passe e ele tinha
que se apresentar imediatamente ao seu novo clube, os dois se estranharam. Em
um ríspido bate-boca no campo onde o São Bento realizava um coletivo, Bife
disse a Rípoli que tinha nome de carne de animal, mas era gente e sabia
conversar, com o seu interlocutor retrucando que o dinheiro que o seu time
havia desembolsado para adquirir seu atestado liberatório dava comprar uma
boiada inteira e não apenas um bife...
Bife foi para Piracicaba,
porém não chegou a um acordo com o XV para assinar contrato e retornou a
Sorocaba, sem dar satisfação ao seu novo clube. Como, decididamente, Bife e
Rípoli não iam se entender, o clube piracicabano aceitou a proposta do
presidente Lino Miranda, de emprestar Bife ao Mixto, até que “baixasse a poeira
entre os dois”. Lino Miranda, que foi pessoalmente a Sorocaba, acompanhado do
radialista e diretor mixtense Antero Paes de Barros, buscar Bife, garantiu ao
jogador que estava tudo certo entre os dois clubes, com a devolução dos Cr$ 50
milhões ao time do interior paulista.
O cheque dado pelo Mixto ao
XV de Novembro, em uma negociação fechada na mansão de Rípoli, em Piracicaba, para o retorno do atacante, depois do empréstimo, não tinha fundos. Começou, então, uma peregrinação de dirigentes do time
piracicabano na sede do Mixto, na tentativa de receber os Cr$ 50 milhões.
Adepto da filosofia do italiano Nicolau Maquiável, Lino Miranda comprava
[jogadores] e não pagava e vendia [jogadores] e não liberava, mantendo seus atestados
liberatórios. “Enquanto eu tiver mãos para assinar cheques, o Mixto compra
qualquer jogador...” – gabava-se Lino Miranda.
O Campeonato Mato-grossense
de Futebol daquele ano ia começar e um diretor do XV veio a Cuiabá para evitar que
Bife defendesse o Mixto, o que impediria o atacante de ser inscrito na
Federação Paulista de Futebol para jogar pelo time piracicabano. Não registrar
Bife na FMF era parte do acordo do empréstimo, por tempo indeterminado, entre
os dois clubes e cujo cumprimento o XV exigia, enquanto a pendência do “cheque
voador” – aquele que vai e volta às mãos de quem o deu – não fosse resolvida...
Sobre o pagamento dos Cr$ 50
milhões, Lino Miranda enrolou mais uma vez o XV de Novembro, mas garantiu ao dirigente que
estava em Cuiabá que seu clube não ia registrar Bife. O Mixto ia jogar em
Rondonópolis contra o União e na hora do embarque do time lá estava na sede do
alvinegro o diretor do clube paulista para comprovar que Bife não estava na
delegação.
A delegação do Mixto partiu e o diretor
do XV também. Mas o ônibus do alvinegro fez uma parada na Avenida Fernando
Correa da Costa, nas imediações do Café Brasileiro, para que Bife saísse do
porta-malas do carro de Lino Miranda e se juntasse a delegação. Não só viajou
como jogou. Sem o atestado liberatório de Bife, que o Mixto nunca entregou ao
XV de Novembro, o clube de Piracicaba não tinha como registrar o seu jogador na
FPF...
O radialista Antero Paes de
Barros, que à época era diretor do Mixto, acha que a propalada fuga de Bife no
porta-malas do carro é simplesmente uma lenda. Como os outros personagens de
Mato Grosso nessa história – Lino Miranda e Bife – já subiram para o andar
superior...
Quanto ao cheque de Cr$ 50
milhões, até hoje, decorridos 40 anos, não se tem notícias se foi quitado e
resgatado...