Orlando Antunes |
Em países onde a
sobrevivência de treinadores de futebol de todos os níveis depende
exclusivamente de resultados positivos – como é o caso do Brasil – esses
profissionais também perdem o emprego pelos mais bizarros motivos. E em Mato
Grosso, onde o profissionalismo foi implantado em 1967, algumas demissões de técnicos
foram tão inusitadas que passaram a fazer parte do folclore do futebol estadual.
1971: o Palmeiras, do Porto,
jogava em Campo Grande, contra o Comercial, pelo Campeonato Estadual. Terminado
o primeiro tempo, o treinador Aírton Moreira, o Aírton Vaca Brava, ficou no
campo dando entrevistas. Ao descer para o vestiário, encontrou a porta fechada.
E a porta só foi aberta para o presidente Délio Oliveira anunciar que Vaca
Brava estava demitido e o novo técnico alviverde a partir daquele momento era o
argentino Juan Rollon...
1976: o técnico Roberto de
Jesus César, o Careca, estava fazendo a preleção para o jogo que o Mixto ia
disputar dali a pouco contra o Operário na decisão da vaga para o Campeonato
Nacional daquele, quando o presidente mixtense Lourival Fontes chegou ao Hotel
Mato Grosso. O massagista Benedito do Nascimento Lisboa não o deixou entrar na
sala onde Careca conversava com a rapaziada. Careca foi demitido na hora por
Fonbtes. Mas com a histórica vitória do Mixto por 3x2 a demissão deu em nada...
Agora, ser demitido por causa
de uma “peneirada” é um fato inédito no futebol mato-grossense. Mas foi o que
aconteceu, com uma figura muito conhecida nos meios esportivos, por causa de
causa de sua longa carreira como árbitro de futebol no Paraná e em Mato Grosso
e ultimamente como jornalista esportivo: Orlando Antunes.
No linguajar esportivo,
“peneirada” é simplesmente treinos ou competições relâmpagos que clubes
organizam periodicamente para que seus “olheiros” e até diretores possam
avaliar as condições técnicas de garotos e até rapazes de idades mais avançadas
que sonham em se tornarem “astros” da bola. Muitas vezes, seus pais sonham mais
do que eles e bancam suas despesas quando ficam sabendo que clubes famosos vão
realizar “peneiradas”.
O lateral direito Cafu, por
exemplo, era participante renitente de “peneiradas”. Era reprovada em uma, mas
na próxima de que ficava sabendo lá estava ele brigando para conquistar seu
espaço no futebol. Sua insistência acabou dando certo, com Cafu se tornando
jogador de bola. Tanto é que disputou várias Copas do Mundo como titular da
Seleção Brasileira.
Em 2004, Orlando Antunes foi
contratado para trabalhar como supervisor do Luverdense Esporte Clube, de Lucas
do Rio Verde. No dia que ele se apresentou para iniciar seu trabalho, o
treinador Diniz, que estava tentando montar o time que hoje disputa a Série B
do Campeonato Brasileiro e é o xodó dos luverdenses, pediu as contas e voltou
para Sorriso. O então e até hoje eterno presidente do Luverdense, Helmute
Lawisch, não pensou duas vezes e virando-se para Orlando Antunes, disse-lhe no
seu linguajar gauchesco: “Tu é o novo treinador a partir de agora...”
Escudado na sua longa
vivência no mundo da bola como árbitro e os conhecimentos que havia acumulado
em um curso de treinador de futebol, Orlando Antunes topou o novo desafio. Mas
como montar um time de futebol em uma cidade que nem campos possuia? A moçada
luverdense preferia o futebol soçayte e o futebol de salão, atividades
esportivas muito prestigiadas pelas grandes firmas do município, e que lhes
proporcionavam bons empregos...
A decisão do hoje poderoso LEC
era montar um time para disputar a principal divisão do futebol mato-grossense
naquele ano. Uma determinação do presidente Helmute a Orlando Antunes:
aproveitar o máximo de “pratas da casa” na equipe profissional. As “peneiradas”
iniciadas por Diniz para formar a base tiveram sequência sob o comando de
Orlando Antunes.
Depois de muitos treinos com a participação de quase 300 candidatos a boleiros nos
campinhos de Lucas do Rio Verde, inclusive à noite, porque muitos deles, trabalhava durante o dia, o técnico marcou um coletivo
para o local onde seria construído o atual Estádio Passo das Emas e que tinha
dimensões oficiais. De tudo o que viu, apenas uns sete garotos de 17 e 18 anos
chamaram a atenção de Orlando Antunes. Entre eles, Dudé, jogador versátil e
único profissional do grupinho.
Antes do coletivo final,
Helmute teve que fazer uma viagem de emergência, mas deu uma ordem expressa a
Orlando Antunes: “Não dispense ninguém antes de eu voltar da viagem!...”
Terminado o coletivo,
Orlando Antunes colocou os jogadores numa roda no centro do campo, pegou uma
prancheta para nominar quem deveria se apresentar na segunda-feira. Entre os
jogadores adultos que vinham participando das “peneiradas” não sobrou ninguém.
“Minto. Sobrou Dudé...” – recorda Orlando Antunes.
Na segunda-feira bem cedo, já
em Lucas do Rio Verde, Helmute Lawisch convocou Orlando Antunes para uma
conversa e foi curto e grosso: “Tu não é mais treinador do time. Trocastes os
pés pelas mãos e não me obedecestes. Estás fora e vai continuar somente como
supervisor...”
Para Orlando Antunes deve ter sido a primeira vez que um treinador
perdeu o cargo por causa de uma “peneirada”...
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